Sobre as "medidas emergenciais no transporte público" pedida pelos empresários

Apr, 2020 - 4 min.
covid-19

Na semana passada, a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), entidade representativa do empresariado de ônibus, em conjunto com a Associação Nacional de Transportes Públicos e o Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Públicos de Mobilidade Urbana, divulgou uma carta pública na qual analisa a situação da pandemia de COVID-19 e solicita ao governo federal uma série de medidas emergenciais de apoio ao setor.

Entre as medidas, está a solicitação de ajuda mensal de R$2,5 bilhões na forma de compra de passagens, a definição de uma oferta mínima de transporte, o barateamento do óleo diesel em 50% e a carta branca para “suspensão temporária” dos contratos de trabalhadores, cuja remuneração (no valor do seguro-desemprego) seria paga pelo governo.

O Movimento Tarifa Zero BH, que luta pela efetivação do transporte público como um direito social desde 2013, vem a público se posicionar sobre as solicitações das empresas e contribuir com o debate. Pois bem, estamos decepcionados, mas não surpresos. Historicamente, os empresários de ônibus no Brasil sempre demonstraram pouca consideração com a população usuária e com os trabalhadores rodoviários. Ao pedir um montante emergencial de ajuda, o empresariado — como faz rotineiramente — chantageou a população com a ameaça de colapso do transporte em sete dias, e, sintomaticamente, não apresentou nenhuma consideração sobre a forma de gestão do transporte público.

A solicitação de ajuda na forma de compra maciça de passagens antecipadas deixa em aberto um dos aspectos mais graves da manutenção do transporte público nos tempos de pandemia: a necessidade de ônibus lotados para a rentabilidade empresarial. Nas últimas décadas, a maior parte dos municípios tem liberalizado sua forma de regulação, gestão e financiamento do transporte público — passando de uma remuneração por número por serviço prestado para uma remuneração por passageiro pagante. Em linhas gerais, essa mudança significa que os mecanismos principais que incentivam o lucro dos empresários deixam de ser a oferta de viagens e passam a ser o aumento proporcional do número de passageiros, com a redução de custos. Isto é: só o busão lotado contribui para o lucro.

Ora, se a ajuda governamental vem na forma de compra de passagens — e não de garantia mínima de viagens — não há mudança nenhuma no mecanismo de incentivo. Isso significa que os quadro de horários das viagens vão se reduzir pelo menos na mesma proporção que a demanda, em função da quarentena. Ou seja, aquele busão lotado da hora de pico permanecerá lotado — agora colocando em risco de contágio os trabalhadores de serviços essenciais que não podem paralisar suas atividades.

É urgente que seja colocado no centro de debate a forma de controle que o poder público tem sobre a oferta de transporte coletivo. Em outras cidades no mundo, o transporte é totalmente contratado por frete e altamente subsidiado, retirando assim as lógicas perversas da cobrança tarifária: superlotação, escassez de ônibus, oneração do passageiro. Lembramos, novamente, que, constitucionalmente, o transporte público é um direito social de prerrogativa municipal que pode, ou não, e de acordo com as circunstâncias, conceder a operação à iniciativa privada.

A ameaça de demissão de mais de 125 mil trabalhadores, junto com a velha retórica do lockout, ressaltam não a crise do setor, mas o quanto os empresários são dispensáveis para o transporte público, ainda mais em um momento de crise. A garantia de serviços básicos e essenciais deve sempre ser prerrogativa pública, e nesta pandemia, mais que nunca essa questão está demonstrada.

Sendo assim, sugerimos as seguintes medidas emergenciais:

Ressaltamos, Crise é Encruzilhada, e a retomada daquilo que é público e garantidor da vida cotidiana é urgente.

Belo Horizonte, 03 de abril de 2020.